quinta-feira, 1 de novembro de 2012


Seis da manhã. Ele olha para o teto como quem procura uma motivação para se levantar e ir trabalhar. Faz um café preto, come um pedaço de pão, veste sua camisa de botão azul céu e vai, naquele velho e maltratado Fiat uno. São tantos semáforos pelo caminho, tantos carros e tantas buzinas, que te sobra tempo suficiente de pensar na vida com certa melancolia. São trinta e dois anos de uma vida água morna. Sujeito calmo, sorridente, sério no local de trabalho. No seu currículo há duas graduações e uma especificação. Não se tem reclamações claras sobre o aquele indivíduo neutro. Seus defeitos são internos, são monstros que vivem na parte escura da psique. Trabalhou cedo, estudou e foi ética e ecologicamente correto a vida toda. É bom e sem sal o bastante para fazer com que ninguém lhe tenha amor verdadeiro. É eclético demais culturalmente falando, e flexível demais: não lutava por sua opinião nem tinha ciúmes exagerados, era de fato um bunda mole. Hoje sem filhos que lhe dê alegria ou mulher que lhe esquente a cama, aquele cara morno está fadado à rotina: trabalhar a semana inteira, ler livros no tempo livre e escrever poemas medíocres depois de duas cervejas no bar da esquina. Uma vida sem amor ou alegria carnavalesca, como água que não borbulha, mas que se aquece para dizer que existe.

Vanessa Vieira

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